ACESSO FÁCIL
Pesquisar
Close this search box.

Famasul repudia “tema” da Imperatriz Leopoldinense para o Carnaval 2017

Em nota oficial a Famasul – Federação da Agricultura e Pecuária de MS vem a público manifestar o seu posicionamento em relação ao tema e à abordagem escolhida pela G.R.E.S Imperatriz Leopoldinense, do Rio de Janeiro, para o Carnaval 2017.

O Carnaval é a principal festa popular do Brasil. Pessoas do mundo inteiro voltam os olhos para o Rio de Janeiro durante este movimento cultural e se encantam com as belezas criativas expostas com contextos históricos, político-econômicos e atuais. Além de alegria e encantamento, as escolas de samba trazem informação e conhecimento. Entretanto, a falta de um aprofundamento sobre o tema escolhido pode distorcer a realidade e reforçar estigmas e preconceitos.

É o que está acontecendo a G.R.E.S Imperatriz Leopoldinense, que para o Carnaval 2017 do Rio de Janeiro, traz à tona um assunto já ultrapassado onde é distorcida a figura do produtor rural. Com o tema ‘XINGU – O CLAMOR QUE VEM DA FLORESTA’, o samba enredo e as fantasias da escola constroem um argumento onde o produtor rural é visto como destruidor, poluidor e violento e, nem de longe, representam o homem do campo que trabalha em prol do desenvolvimento do país.

O trabalho no campo se desenvolveu nas últimas décadas de forma positiva, no contexto da sustentabilidade. Somos referência, por exemplo, na implementação dos sistemas de integração, que unifica na mesma área o plantio de lavouras, produção pecuária e árvores plantadas. Com isso, caminhamos para a consolidação do conceito Carne Carbono Neutro, onde a presença das árvores em sistemas de integração neutraliza o metano entérico exalado pelos animais.

De acordo com a pesquisa da Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, atualmente, a área com algum tipo de adoção de sistema ILPF no Brasil abrange 11,5 milhões de hectares.  Com destaque para Mato Grosso do Sul que possui dois milhões de hectares nesta modalidade de tecnologia produtiva.

Nosso Estado, em 2006, tinha cerca de 120 mil hectares de eucalipto plantados. Em julho de 2016 alcançamos 950 mil hectares. Uma evolução de mais de 830 mil hectares em uma década. E o mais importante: a maioria desta área plantada de eucalipto está na costa leste do Estado, em uma região com predomínio de solos arenosos e que anteriormente era ocupado por pastagens com baixa capacidade de lotação.

A produção de grãos no Estado aumentou 119,2% nos últimos 10 anos, chegando a 16 milhões de toneladas na safra 2014/15, enquanto que a área de cultivo agrícola cresceu apenas 34% no mesmo intervalo, demonstrando assim o perfil empreendedor e consciente do setor. A relação entre as proporções demonstra que hoje o agricultor consegue produzir mais em uma área menor, com uma produtividade que se aproxima a quatro mil quilos por hectare por safra.

A população mundial deve atingir cerca de 9,7 bilhões de pessoas até 2050. A previsão é de que, para atender esta demanda, a produção mundial de alimentos precise aumentar 80% até 2050. E o Brasil deverá ser o principal responsável para que esta meta seja alcançada, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). O cenário sustentável do agro se faz presente nas esferas econômica, ambiental e social.

Respeitamos o processo criativo da escola de samba em questão. O que não concordamos é o estímulo feito para que o produtor seja visto como o vilão do nosso País. Representar, deste modo, o único setor que apresentou saldo positivo na geração de emprego em 2016 e responsável por 21,35% do PIB, além de alimentar a população mundial, é cruel, reducionista e mostra o poder destrutivo da falta de informação.

Reiteramos que a falta de conhecimento pode levar a equívocos e julgamentos sobre o setor e confiamos no poder da comunicação e do diálogo para que distorções sejam corrigidas.

Outro lado

No site oficial das Escolas de Samba do Rio de Janeiro conta a história do samba enredo da Imperatriz Leopoldinense “Xingu, o clamor da floresta”

SINOPSE

“O índio estacionou no tempo e no espaço. O mesmo arco que faz hoje, seus antepassados faziam há mil anos. Se pararam nesse sentido, evoluíram quanto ao comportamento do homem dentro da sociedade. O índio em sua comunidade tem um lugar estável e tranquilo. É totalmente livre, sem precisar dar satisfações de seus atos a quem quer que seja. Toda a estabilidade social, toda a coesão, está assentada num mundo mítico. Que diferença enorme entre as duas humanidades! Uma tranquila, onde o homem é dono de todos os seus atos. Outra, uma sociedade em convulsão, onde é preciso um aparato, um sistema repressivo para poder manter a ordem e a paz.” (Orlando Villas-Bôas, sertanista)

INTRODUÇÃO

Hoje, não vamos falar apenas de lendas, nem alimentar mistérios que dependem de nossa imaginação. Você cresceu, guerreiro menino, não é mais um curumim. Teve coragem para enfrentar as tucandeiras, traz no rosto as marcas do gavião e já consegue enxergar além das curvas do caminho. Hoje, vamos falar da verdade. É preciso entender o passado para saber o que nos aguarda no futuro.
Quando seus pés tocarem o chão, pise com a certeza de que ninguém ama tanto esta terra como a nossa gente. Somos o povo da floresta. Os espíritos de nossos ancestrais dormem nos troncos das árvores. A candura de nossas mães flutua no ar, e se espalha no perfume das flores. O amanhã resiste em cada semente carregada pela força do destino, conduzida pelos pássaros que enfeitam nossos cocares, orientam nossas flechas e repovoam essa gigantesca floresta. Nós somos a floresta e deixaremos que o vento leve este canto aos homens de boa vontade. Eles precisam nos ouvir.
Sim, guerreiro menino, porque quando não existir mais floresta, nossa gente será apenas lembrança e o que eles chamam de país, já não terá nenhuma esperança…

CELEBRAÇÃO TRIBAL

Nossos irmãos vêm de canoa, dos lugares mais distantes da floresta. Fazem uma roda no centro da aldeia. Corpos pintados, iluminados pela lua cheia. É noite de festa. Vamos dançar ao redor da fogueira. Mavutsinim, o Criador, nos chamou para celebrar a paz e o amor. Tambores, flautas e maracás tocarão a noite inteira. E quando o dia clarear, nossa alma despertará: formosa, cabocla, guerreira… Verdadeiramente brasileira!
Devemos encarar a vida com simplicidade. A terra aquecida pelo Sol é a mesma que a Lua protege com o véu da noite, guardando as surpresas para o novo dia. Sonhos existem, mas o destino somos nós que traçamos: colhemos o que plantamos. A morte faz parte da vida. Ela é o resultado de nossas experiências. É a colheita de nossa existência. Ao guardar os espíritos de nossos antepassados em troncos sagrados, criamos uma ponte para a eternidade, No Kuarup, o que era mito, vira realidade. Celebramos essa derradeira viagem com muita alegria, festejando a certeza de que raros são os que partem com tamanha serenidade – servindo de exemplo para os seus e a comunidade. Cantamos e dançamos, orgulhosos do nosso jeito de fazer parte da Humanidade.

O PARAÍSO ERA AQUI

Amamos esta terra muito antes de ela se chamar Brasil. Desde o tempo em que não havia fronteiras. Era céu e chão, até onde os olhos pudessem alcançar, percorrendo serras, florestas, rios, cachoeiras… Sobre o ventre da Natureza, Tupã estendia o seu manto. Como por um encanto, do lago surgia um pássaro sagrado, protegendo a nação Kamayurá, fazendo a vida brotar… intensa, pujante, vibrante, com uma infinidade de cores. Nuvens de borboletas enfeitavam as flores. Pirarucus, tambaquis e tucunarés povoavam os igarapés. Aranhas tecelãs bordavam suas teias, pirilampos faiscavam na aldeia. Do alto dos buritis, ecoava uma sinfonia. Cigarra cantava, acompanhando um coral de aves. O som grave dos bugios e o esturro da suçuarana alertavam para um risco permanente à nossa frente. Quem vem lá? Kayapó ou Kalapalo? Tatu ou tamanduá? Assim era a nossa floresta, casa de nossa gente. Não foi por acaso que, quando o caraíba aqui chegou, imaginou estar no Paraíso – um Jardim Sagrado, de onde o próprio Deus dele o expulsou.

O “ABRAÇO” DA SUCURI

Se perderam o seu Paraíso, os caraíbas partiram para conquistar o nosso, pequeno guerreiro – talvez, por vingança de Anhangá, o feiticeiro. Impulsionadas pelos ventos da cobiça, as naus aportaram em nossas praias, trazendo ensinamentos que os invasores nunca ousaram praticar. Nada mais seria como antes. Em vez de nos tratar como semelhantes, nos chamaram de selvagens e tentaram nos escravizar. Vinham do Velho Mundo e representavam a civilização. Chegaram arrogantes, se apoderando de nossas terras e riquezas. Levaram ouro, prata e diamantes, e uma madeira que tingia com sangue, lembranças de tantas belezas. Em troca, traziam espelhos, doenças e destruição. Sua missão era usar a cruz de um Deus que morava no céu, fincando marcos aqui e ali; usando palavras sagradas, deixaram nossa gente esmagada, como no abraço lento e mortal da sucuri.

BELOS MONSTROS

Caraíba não mede consequências. Acredita na sua ciência, buscando o que chama de progresso. Derruba floresta, espalha veneno e acha o mundo pequeno para semear tanta arrogância. Invade nossas terras, liga a motosserra e no lugar dos troncos sagrados, planta ganância. Caraíba precisa de mais energia para alimentar os seus interesses. Cria verdadeiros monstros. Belos monstros… usinas que devoram rios, matam peixes, secam nascentes, inundam tabas e arrastam na lama o futuro de nossa gente. Não podemos deixar, guerreiro menino, que afoguem o nosso destino. Nossa casa é aqui! E não devemos nos curvar. Precisamos honrar cada dente do colar, cada palavra do irmão Raoni!

CACIQUES BRANCOS

Também é justo lembrar de caraíbas que foram amigos. Eles se embrenharam pelo sertão para fazer do Brasil uma grande nação, criando picadas, abrindo estradas e campos de pouso para a aviação. Foram os primeiros a escrever nessas terras a palavra integração. Eles ficaram encantados com o nosso jeito de ser. Não conseguiam entender que para respeitar e ser respeitado, nenhum de nós precisa vigiar ou ser vigiado. Responsabilidade sempre foi um princípio honrado com a família e a comunidade. Fizemos um kuarup para saudar esses caciques brancos em nossos rituais. Eu ainda era rapaz, pequeno guerreiro, quando os vi no Roncador. Acompanhei suas expedições. Vinham em batelões, trazendo respeito e amor. Ficarão para sempre em nossos corações, protegidos por Tupã. Louvados sejam os irmãos Villas Boas, que nos ajudaram a encontrar a passagem para o Amanhã!

O CLAMOR DA FLORESTA

As nações xinguanas se reúnem para celebrar o orgulho de ser índio e pedem licença para falar: Enquanto o caraíba não recuperar o seu equilíbrio, a Natureza agonizará. E sem ela, sem a proteção da Mãe de todos nós, estaremos ameaçados – seja na terra dos civilizados, ou nos confins dos povos isolados. Já é tempo de o caraíba cultivar a humildade e aprender com o índio o que chama de sustentabilidade. Precisa esquecer os lucros, o progresso, o consumo e o desenvolvimento; zelar pelos sentimentos e os compromissos com a Humanidade, retirando da Natureza apenas o que basta para o seu sustento.
Jovem guerreiro, voe nas asas do vento e espalhe estas palavras de Norte a Sul. Os povos não-índios precisam entender que é chegado o momento de ouvir o clamor do Xingu!

Pesquisa, desenvolvimento e texto:
Cahê Rodrigues, Marta Queiroz e Cláudio Vieira Junho de 2016

GLOSSÁRIO

Anhangá – Segundo o índio, espírito que vagava após a morte, atormentando os viventes.
Batelões – Embarcações de fundo chato, usadas para navegar em rios rasos.
Bugio – Espécie de macaco também conhecido como guariba ou barbado.
Buriti – Palmeira que dá um fruto do mesmo nome, rico em vitamina C e largo uso na cosmética.
Caraíba – Segundo o índio, o branco.
Kalapalo – Uma das 16 etnias do Parque Indígena do Xingu.
Kamayurá – Uma das 16 etnias do Parque Indígena do Xingu
Kayapós – Uma das etnias do Brasil Central.
Kuarup – Ritual xinguano em homenagem aos mortos. Mavutsinim – Segundo a etnia Kamayurá, o primeiro homem, o Criador.
Pirarucus, tambaquis, tucunarés – Peixes dos rios da Amazônia e do Brasil Central.
Raoni – Líder indígena da etnia Kayapó. Roncador – Serra do Roncador, o ponto mais central do Brasil, situado entre os rios das Mortes e Araguaia, entre os rios Kuluene e o Xingu, no Mato Grosso.
Suçuarana – Onça parda.
Tucandeira – Formiga cuja picada é capaz de matar um homem. No ritual de iniciação, quando da passagem do menino índio para a adolescência, os jovens guerreiros provam a sua coragem colocando a mão em luvas de palha com várias dessas formigas, suportando as ferroadas durante 15 minutos. Tupã – O deus supremo dos indígenas.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

O Xingu dos Villas Bôas – Agência Estado/ Metalivros
Parque Indígena do Xingu 50 Anos – Almanaque Socioambiental
A Marcha Para o Oeste – A epopeia da Expedição Roncador-Xingu / Orlando e Cláudio Villas Bôas
Xingu, Viagem Sem Volta – Julio Capobianco/ Editora Terceiro Nome
Narrativas sobre povos indígenas na Amazônia – José Vicente de Souza Aguiar / Fapeam
Diários Índios – Os Urubu-Kaapor – Darcy Ribeiro/ Companhia das Letras
Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas – Padre João Daniel/ Contraponto
Xingu, 55 Anos – O que o Brasil tem a aprender, por Renata Valério de Mesquita – Revista Planeta, Edição 519 – Abril 2015
Patrimônio Cultural do Xingu, por Ulisses Capozzoli – Scientific American – no 44 – Edição Especial

[youtube https://www.youtube.com/watch?v=ubVBxWbv4eM&w=420&h=315]

COMPARTILHE AGORA MESMO